PYTUHEM - “Estamos vivendo uma guerra silenciosa e covarde”


Essa crítica sobretudo está sendo escrita para colaborar com o lançamento de uma plataforma digital: “TEATRO E OS POVOS INDÍGENAS” - TePI  - que teve seu lançamento na versão digital em 2021 e ainda segue com sua programação até 2022 tendo diversas propostas artísticas e trocas de conhecimento, performances, peças, leituras dramáticas, mesas redondas, lives, podcasts etc. Aqui escolho uma performance de Zahy Guajajara, pois está permanente na plataforma. Um dos principais interesses em escrever sobre essa plataforma digital é tornar possível o contato com novos espectadores.

Como pessoa branca devo tomar certos cuidados ao me colocar a interpretar conteúdos que não pertencem a minha cultura, é um momento de escuta, o que torna ainda mais interessante num ponto de vista experiencial artístico, escrevo a partir das impressões e dos afetamentos, ao todo são 16m32s de videoperformance. Ouvir um idioma que não costumamos escutar, que nem sequer conhecemos ao longo de nossas vidas escolares, por exemplo, se aproxima com experiências de deslocar-me de país, mas dentro do meu próprio território? Este território nunca nos pertenceu, não pertence a ninguém de nós brancos, é um todo, é um ecossistema, é por direito dos povos oríginarios, e não respeitamos, aliás, o capitalismo, o neoliberalismo, a globalização, as bitcoins, as políticas etno-eco-geno-cidas invisibilizam e exploram, mas em contrapartida, ou melhor, seria em contra-cultura (contra aquela hegemonica-branca-cis-heteronormativa)? Estão (re)existindo Guardiões das Florestas, 305 etnias e cerca de 900 mil indígenas no Brasil, mesmo a cada dia sendo mais violentados pelo CI$tema, em meio a pandemia e a atual conjuntura política essas violações de direitos humanos se intensificam, regredimos enquanto nação.

Zahy conta histórias de sua vida e da resistência de sua ancestralidade, sua performance começa com a manipulação de luz e seu rosto enquanto conta, vai se formando novas imagens a partir do jogo de luzes e sombras, muita luz que esconde e mostra com as mãos evidenciando partes de seu corpo e traços de seu rosto isolados, ora imagens que lembram animais ou coisas naturais se formam, referente ao que Zahy conta, indico assistir e ouvir com sua própria voz e o dialeto de sua etnia, sobre suas experiências de morar fora e longe de sua família e origens, de seu primeiro trabalho com 17 anos que incluía mediar entre sua e a língua portuguesa. Sobre os Guardiões da Floresta que guardam também outro povo, outra etnia que vive mais isolado e cada vez mais encurralado pela ‘civilização’. 

Nos últimos 5 meses, antes da estreia, 5 guardiões GUAJAJARAS foram assassinados. “Estamos vivendo uma guerra silenciosa e covarde”, a pandemia nos parou, “somos obrigados a nos recolher”, mas ao mesmo tempo “o governo trabalha de forma veloz”. Por fim, a performer está na mata, trabalha com elementos naturais, barro ou argila, folhas secas, fundos verdes naturais. Durante as mudanças de ações também há uma sonoplastia diferenciada, como o som de queimadas, chuvas, floresta à noite, e cantos com a voz de sua mãe. A performance foi gravada de forma remota entre as artistas, Zahy e Mariana, por videochamadas.

PYTUHEM (respirar), pensar em novos modos de viver, ou melhor, novas formas de (re)pensar a nossa própria existência. Um novo vírus como uma ameaça para nós, que ataca pulmões, mata pela falta de ar - nós: que estamos confortáveis em nossas cadeiras com nossos WI-FIS velozes apreciando a nova arte-remota -, se torna muito mais ameaçador e violento e mais catastrófica, se intensifica com as manobras políticas, “o vírus branco” o qual indígenas são vítimas desde a colonização… “Seria [a pandemia] uma mensagem do universo?”

 

Sinopse

PYTUHEM l Uma carta em defesa dos Guardiões da Floresta convida vocês a conhecer nossa história. Pytuhem (Respirar) é uma carta que denuncia o que está acontecendo com os Guardiões da Floresta, um grupo de Guajajaras que luta pela preservação da floresta, do seu povo, sua ancestralidade e sua identidade. Os Guardiões da Floresta em Arariboia, Maranhão, protegem também seus parentes Awá Guajá, indígenas que vivem completamente isolados, sem contato com a civilização. (R)existir é a única possibilidade de existir.

Concepção e atuação: Zahy Guajajara

Direção: Mariana Vilas Boas

 

Performance

GUAJAJARA, Zahy. PYTUHEM | Uma carta em defesa dos guardiões da floresta. Plataforma Digital TePI: 2021, sessão TePI PLAY. < Estreiou em 03/12/2021 e está disponível permanentemente em https://tepi.digital/uma-carta-em-defesa-dos-guardioes-da-floresta-brasil/ >



 Acadêmica: Cassiana soares (Artes Cênicas UEM)

Maringá, 10 de Dezembro de 2021

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